sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

-x-

mais um dia
menos um dia

-x-

um dia
dois dias
nenhum dia

-x-
Nada de novo
nada de bom

(... esqueci do Sol
que ainda brilha lá fora




e também
das flores)

-x-

Vai dia
Vem dia
o mesmo dia ou outro dia?
depende de mim
depende de você
(há gente que faz
há gente que desfaz 
a gente que nem faz nem desfaz e ainda leva a fama)

 não depende de mim nem de você se haverá este outro dia
vou eu
vem você
vamos e voltamos
por todo lado
enchendo as ruas
(mas sempre por caminhos diferentes que jamais se cruzarão)

-x-

qual será o destino

da semente que
após sorvido o sumo da fruta
cuspimos no quintal?

- quinta feira eu respondo


segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Na ponta da manhã despontava o Sol. E o Sol luzia em verde teu olhar. As cores do universo brincavam. Que azul do céu a colina esconde se a prata do luar fugiu por detrás do horizonte?
Surgiu um caudaloso rio pela planície que agora jaz cortada em partes. A parte minha é a da direita, diz o viajante que veio de de tão longe como se o vale fosse uma pizza gigante.
A manhã nasce mais fresca quando mente e corpo estão descansados. O vento fica mais leve e o coração se enche dessa leveza. As flores, ainda nas sombras de uma árvore frondosa, se espreguiçam, eriçam suas pétalas em direção aos olhos meus e seu colorido mágico me invade. Esguicham seu perfume na brisa atiçando meu olfato que já sorvia erotizado o cheiro alegre da manhã.
Uma noite de amor transforma o mundo.


-x-

Volutas de fumaça se erguem no horizonte distante. Sinais de fumaça ou chuva, pergunta um distraído peregrino, ou seja, eu. Informação ou chuva? Desinformação ou Sol? - Perguntas jamais se calam, especialmente quando não têm respostas.
Não importa, pois para lá daquele distante monte azulado ergue-se um vale florido por onde corre um doce riacho nas águas do qual repousa o corpo macio e roliço de uma viçosa camponesa. Seu cheiro se mistura e se confunde com a das flores e certamente faz fremir o vento e erguer a intensidade do zumbido de uma abelha colorida. Este poder da mente de criar cenários imaginários é um poder que jamais posso perder. Quer dizer, um pouco que o perdi, pois o barulho e confusão que essa gente faz por pouca coisa me fez esquecer um pouco de tudo me deixando um pouco míope e surdo (confesso que idade tem contribuído para tanto)  e peço devolução a quem encontrá-lo por aí.
Mas voltando à camponesa, deixe-me perder-me agora em seus hipotéticos braços...

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Eu não sei se foram os olhos profundos, o toque da pele, a textura da cútis ou seu cheiro que me seduziram. Talvez tenha sido o conjunto da obra.
Os seus olhos, de um negro absurdo, redondos, gigantes, hipnóticos, aveludados, neles vislumbrei a síntese dos tempos e, como num poço sem fim, mergulhei para sempre e ainda estou caindo.
A pele, a um simples primeiro contato,  me arrepiou. A textura da cútis parecia uma continuidade de mim.
Certamente, aquele tecido em que deitei meu corpo me foi concedido por encomenda. Literalmente rolei pelos seus meandros, senti a sua extensão como uma verdadeira conquista, como aquela dos navegantes que ousaram e tomaram para si o Novo Mundo. O cheiro há de restar para sempre em minha memória. Vivo os dias em sua lembrança, inebriado, bêbado e enlouquecido.
Enquanto tirava sua roupa, cada peça por vez e lentamente, foi esculpindo em mim uma ereção universal. Ela tinha um jeito de se despir descortinando aos poucos um espetáculo escondido que era seu corpo.
E aí, então, fui todo língua e dedos. Re-esculpi inteiramente o contorno do seu corpo com o cinzel agudo e escarlate de minha língua. Escalei o cume ereto de seu seio, lentamente, fingindo ser difícil a escalada (mas não era). A única dificuldade era como o desvendar de um mistério. E quando a penetrei, não havia mais eu ou ela, pois nos fundimos e viramos um só corpo, uma só emoção. Meu coração pulsava compassado com o seu coração. E nos desvencilhamos do nosso passado, para sermos só o presente dos nossos corpos interpenetrados, na língua, no sexo, na emoção e nos poros.
E eu explodi e ela explodiu. Explodimos ao mesmo tempo como um Vulcão grandioso que irrompe sobre si mesmo. Derramei minhas lavas quentes em seu vale. A partir daí, fomos um e mesmo sempre.




-x-
ai, quem dera. nossos corpos
bailassem encantados
numa dobra
do continuo espaço-tempo
e assim
neste hiato
enfim pudessem
vencerem incólumes
as muralhas
do tempo e da distância
e se fundissem
e se embalassem
e se enrolassem
mutuamente abraçados
e se fundissem nossas belezas
numa só e única beleza
num só verbo e substância
e que o meu rosto em teu rosto
o meu corpo em teu corpo
minha pele em tua pele
minha boca em tua boca
se mesclassem num só corpo
numa só boca, num só rosto e numa só pele
e eu já nem soubesse
onde termina meu braço
onde começa teu colo
onde começa tua lingua
onde termina meu peito
ai, quem dera
fossemos únicos e mesmos
e fossemos dois em um enfim

-x-

é tão mais fácil

(e mais gostoso)

se surpreender
do que buscar
uma inútil explicação

exultei ao ver teus olhos
mas não soube dizer o que significavam

derreti-me
em teu semblante
mas não soube determinar
a origem do fogo que ali ardia

uma aura de mistério
separa tua visão
do teu estulto comportamento

feliz sou enquanto fluo na correnteza da vida
totalmente infeliz entretanto
quando busco a direção e em vão tento nadar

teu seio ereto me aponta e provoca
mas corres na oposta direção

só me resta fugir
errar de novo
(como tantas vezes errei)
e me perder em outros olhos
(como tantas vezes ousei)

-x-

como negar a poesia
que existe no leve voejar de uma borboleta
no bailado rodopiante de uma folha ao vento
ou nas carícias que se fazem os amantes?

sem poesia não há vida
e não fora o colorido dos versos
bem áridas e descoloridas

(e tristes também)

seriam as bibliotecas e as estantes

-x-

a poesia que nasce em mim
nasce como a relva que graceja nas planícies
sem pedir licença ou aplauso
se oferece sem saber de si

-x-

Diz-se através da poesia
tudo que se desejava ter vivido
mas que entretanto não se viveu
daí serem tão perfeitos os amores
ou tão lendárias e diáfanas as fontes
(e até mesmo etéreas e distantes as musas)
que são descritas nos poemas

como faunos ou quimeras
assim são os versos
e por isso nunca ultrapassaram
os limites intransponíveis que separam
a realidade da imaginação

-x-

pois eu tenho esse poder
que há poucos é dado
de amar em silêncio
e falar bem baixinho
o que tenho a dizer
e o que grita me fere os ouvidos
não acredito no amor
que é berrado aos quatro ventos
mas aquele que murmura a brisa
que farfalha nas folhas
que broteja nas fontes
e germina nas sementes da vida

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

De que me adianta
o que um dia escrevi
 - o poema é como a flor
que um dia vicejou sozinha no campo
e morreu sem colorir um olhar.
Eu só sei pensar
 no verso que ainda não compus
o passado é passado
o poema escrito morreu
só ficou o sentimento que um dia senti
ou a saudade
-x-

o vento sopra
 o silêncio fala
 o dia se cala
 e ouve o tempo passar


(quem berra apressado
 faz o tempo calar
 quem fala demais
 faz o vento parar

 como as gaivotas se espreguiçando ao longo das correntezas)

Porque dizer se tudo por si e em si já se diz ?

Para quê batizar com palavras  as coisas se a coisa que representa a palavra já era ela mesma mesmo antes de ser batizada?

Não é o olhar que cria a coisa, mas a coisa que cria o olhar

 por isto quem é sábio pouco fala
 e aponta com um simples olhar o que deve ser sabido
 sem nomear as coisas

 enquanto isso
 os ignorantes esbravejam tolamente sem serem ouvidos

... quem sabe eu fale num outro momento mais oportuno

  por hora sou o silêncio e a solidão de um campo ermo e árido se estendendo até o horizonte.

o vento sopra
 o silêncio fala
 o dia se cala
 e ouve o tempo passar


-x-

Fitam, pela última vez, a terra árida, olhos semi-áridos. É que a tanta tristeza de saudades da extinta beleza, da triste visão do verdor antigo agora vestido de descolorido cinza, juntou os restos de umidade do corpo e preparou uma derradeira lágrima, matando de sede o pobre sertanejo.

-x-

não está na cor

a virtude

dos meus olhos

mas em saberem

tomá-la

emprestada

ao Sol

-x-

as coisas mais belas da vida

veio o tempo

e, inclemente, levou

bom que a lembrança

do que era triste

levou junto consigo

-x-

duas palavras suas

e será meu o céu

e serão minhas as nuvens

as aves, a chuva e tudo mais

que lá habita

uma delas

ainda que suprimida

poderá ser inferida

a outra

jamais será dita

mas procurarei adivinhar

ou seja

não precisa dizer mais nada

seu silêncio será meu céu

seu olhar já me é bastante

e seu corpo há de me valer

-x-

a Lua não é minha

nem de ninguém

pois que de todos

(assim como teu corpo)

por ser de toda gente

aproprio-me

de sua luz

quando teus olhos

a refletem

(doce e inútil consolo)

-x-

o azul gélido

de icebergs flutuantes

dos meus olhos

derrete-se

ante o ardor

do teu olhar

e se espalha

na iris o verde

tépido encontro

de correntezas

opostas no mar

-x-

Ao meu lado

és um Sol e me amanheces

desabrochas meu ser

como a uma flor

em pétalas prenhes de amor

de beijos e abraços

como os pássaros

hei de seguir os teus passos

longe de ti sou sombras de mim

meu coração anoitece

-x-

o que sobra, depois que tudo se acaba?

das grandes cidades o nome

das grandes guerras a fome

e dos grandes reis restam os ossos

mas do amor que te tenho

que há de restar

depois que a gente se for?

na semente que plantamos

nada de nós restará

pois quando a flor nascer

ficará apenas a flor e só ela

-x-

A beleza nunca falta, apenas os olhos podem faltar, disse-me isso uma estonteada e colorida borboleta quando avistava o Sol depontar no horizonte. Mas uma avezinha sozinha no ramo mais alto de árvore reprovou e voou para um lugar ainda mais alto. Ah! essas flores do céu que cantam e voam! Quem me dera ser uma delas e ver o mundo de um jeito diferente. Mas meus pés presos andam no chão, o meu olhar vive preso no céu,e a mente a voar para bem longe.

O vento geme em meus ouvidos e anuncia a tempestade.

O brilho intenso de mil relâmpagos incendeia o céu.

O ronco estúpido de mil tovões entope meus ouvidos.

O poema é mulher : o prazer sexual de gerir a idéia, a dor de parir a palavra e amamentar o verso.

Eu sou homem e só sei fazer a primeira parte

-x-

Toda vez é isso. Tenho tanta coisa para falar, mas não consigo.

Eu queria ser tipo um grande escritor, um grande poeta. Mas quando penso em dizer alguma coisa , algum deles já o disse. Nessas horas eu odeio os poetas por terem dito tudo antes de mim. E eu só fico a repeti-los numa ladainha interminável.