quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Lembranças de mim


Não sei o que dizer
Mas sei o que fazer
Não me ouça
apenas me veja
E o que digo
não siga
pois não há mais
que eu consiga
falar de mim
Meu exemplo
é meu templo
e o dia a dia
meu dever
de ficar em
nada a dever
pois saiba meu amigo
que a minha história
é a minha oratória

Benno

Lembranças de mim


As nuvens mergulhavam no horizonte como gaivotas neuróticas e ensandecidas. Se seguiam o Sol ou perseguiam a Lua nem sei dizer ao certo, mas sei que formavam um espetáculo estarrecedor, num bailado sem propósitos.
Como todos os dias, eu fazia minha eterna caminhada ao longo da praia, contanto caramujos e chutando conchas. Os tórridos grãos de areia, ainda lembrados do calor do desfalescente Sol, acariciavam-me e ao mesmo tempo queimavam-me as solas dos cansados pés.
Eis que mais um dia findava e eu nem sabia qual a razão de tê-lo vivido. Os dias são assim, mesmo os inesquecíveis como o bailado anoitecescente das gaivotas. Toda vez que eu via o céu assim, desabando na noite, eu lembrava de um dia quase noite igual a tantos outros, igual a este mesmo dia de agora, em que eu me perguntava - será que daqui há muitos anos eu ainda lembrarei deste momento? E foi assim que ele se gravou indelével em minha memória. Aquele momento, que nada tinha de especial, ficou ali gravado como uma fotografia para sempre e talvez perdure mesmo além da minha morte.
Dali, daquele momento lembrado, vem minha mania de colecionar momentos aleatórios. Numa hora qualquer do dia, eu resolvo me lembrar daquele momento para jamais me perder de mim. Então, eu procuro uma coisa qualquer, um graveto, um seixo, uma tampinha de garrafa, qualquer coisa que esteja por ali, uma referência menmônica daquela lembrança, que depois guardo num cofre. Este é meu cofre onde guardo as lembranças que tenho de mim. Não das lembranças dos meus grandes momentos, mas daqueles momentos comuns, pequenas fotos do meu dia a dia, que, num dia desses comuns caminhando pela praia eu tive medo de perder na noite do esquecimento.


Benno

Ps: Meu conto "O Oitavo Casamento" foi publicado na excelente revista on-line Germina. Agradeço às editoras da revista, em especial à Mariza Lourenço, a honra que me foi concedida.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

A Pintura Inesperada

A Pintura Inesperada

Aquilo era inteiramente inesperado. Ele não sabia que tinha um tio morando na Europa, mais precisamente na Holanda, nem que este havia se casado com uma Holandesa e muito menos que, por não terem filhos, ele e tornara o único herdeiro necessário deste tio.

O seu tio, falecera há pouco, soube através de um telegrama, alguns meses antes, era viúvo e, por não ter deixado herdeiros, tiveram que procurar o parente vivo genealogicamente mais próximo. E este parente era ele.

Deixou poucos bens. Não era rico, mas possuia uma maravilhosa pintura, nada em dinheiro, alguns livros comuns, nenhuma propriedade imobiliária, pouca coisa realmente.

Recebeu tudo num pacote algum tempo depois.

Chamava a atenção apenas a pintura. Assinada por um tal de Jan Vermeer. Depois ele foi descobrir que Vermeer é um dos pintores mais famosos que já existiram. Uma tela de sua autoria poderia valer milhões de dólares, mesmo porque só haviam apenas algumas dezenas delas.

Levou a pintura a escola de Artes mais próxima para que um especialista analisasse a obra.

Infelizmente, não era um autêntico Vermeer apesar de ser uma excelente imitação. Como era uma pintura muito bonita e bem feita, ele poderia vendê-la por alguns milhares de reais.

Afinal, havia sido um bom negócio ter herdado a pintura. Vendeu e com o dinheiro apurado pode comprar um carro. Nada mal.

Qual não foi sua surpresa ao descobrir que o seu Vermeer, na verdade, era uma falso Vermeer, porém um autêntico Van Megueren , pintor que executou obras originais no mais puro estilo Vermeer, e, para facilitar a venda de seus quadros, assinava como o famoso pintor. O quadro fora vendido por algumas centenas de milhares de dólares.

Afinal, ele aprendeu que uma coisa que por um lado é falsa ainda pode ser uma coisa original por outro.

Benno Assmann

Aviso 1 : Fui vencedor do primeiro lugar no concurso Prata da Casa na categoria contos com o meu conto o Oitavo Casamento.

Aviso 2: Completei 50 anos no sábado dia 10 de outubro.