quinta-feira, 13 de julho de 2017
Entre a aspirina, o anão e o passaporte
Estava eu com uma tremenda dor de cabeça, daquelas de rachar o crânio. Eu não gosto de tomar remédio, mas daquela vez não estava dando para aguentar mesmo. Como não costumo tomar remédio de espécie alguma, especialmente analgésicos, o efeito dele é tiro e queda. É tomar e passar a dor, ao contrário dos que são hipocondríacos e vivem se encharcando de fármacos. A dor é bastante edificante e não porque se render ao primeiro sintoma, enfim, não entendo tanta fraqueza. Mas, quem sou eu para julgar os outros. Cada um é que sabe de si, pois não sabemos de fato se a dor que sentimos é a mesma dor que outra pessoa sente. Deve haver pessoas mais sensíveis a dor do que outras.
Mas, onde encontrar remédio na casa de alguém que não toma remédio? É porque não tomar remédio chega a se uma doença em mim. Procurei em todo canto e não encontrei. Encontrei todo tipo de coisa que estava perdida, as chaves que me fizeram trocar a fechadura da casa, os documentos que tive que tirar uma segunda via, tudo menos o maldito analgésico.
Não queria sair de casa me sentindo daquele jeito, mas não via alternativa.
Procurei em todas gavetas de todos os armários e não encontrei sequer uma aspirina. Sabe, eu prefiro tomar aspirina, não sei porque não quero saber de dipirona, paracetamol, e outros analgésicos populares.
Enfim, decidi ir até a farmácia.
Quando lá cheguei, havia um anão sendo atendido pelo único atendente disponível. E o anão, além de ser muiiiiiiiiiiito baixo, era muiiiiiiiiiiiito chato. Sabe daquele que acha que todos os remédios são caros ou não prestem e pedem sempre uma opção alternativa que não serve também e pedem mais outro até desistir de comprar. E quando desistem de comprar para procurar em outra farmácia, passam para outro item de uma lista interminável de remédios. Pois o anão, além de baixo e chato, também era hipocondríaco. E assim, foi rachando aos poucos minha cabeça, quando, de repente me lembrei que naquele dia era o último dia para eu ir pegar meu passaporte e acabei me esquecendo por causa da dor de cabeça. Caramba, vou ter viajar dentro de um mês e ainda tenho que providenciar o visto.
Seria uma viagem de negócios. Meu chefe me pediu para participar de uma reunião com um cliente no exterior. Seria a primeira vez que sairia do meu país. E esta dor de cabeça para atrapalhar.
O que seria mais importante? O passaporte ou a dor de cabeça?São tantos dilemas que temos que enfrentar pela vida. Isso ou aquilo! Sempre resta a dúvida e uma grande lição que aprendi na vida foi lidar com este grande algoz que é a dúvida.
Coitadas das pessoas que não entendem que uma parte das grandes questões que lhe atormentam são coisas nebulosas que ninguém sabe ao certo a resposta e que as respostas talvez nem existam. Tudo é fácil quando é com outras pessoas ou se é meramente hipotético, mas quando se entra no jogo a dúvida é uma verdadeira tortura.
Certamente, todos diriam: O passaporte! Isso porque não sabem a dor que estou sentindo e isso porque eu sou uma pessoa quase imune a dor. Tenho vários exemplos para citar. Teve aquela vez, quando eu era menino e um menino que eu havia encrencado foi buscar sua patota para me dar uma surra e como fiquei orgulhoso de não ter dado um pio. Eles ficaram tão impressionados, que fugiram assustados. Me senti um espécie de super herói. Mas, de que vale ser um superherói se não se aguenta uma dor de cabeça? Eu devia era dar umas porradas no anão, mas me acusariam de discriminação. Eu não tenho nada contra os anões. Só contra aquele anão que não acabava nunca sua lista infinita de remédios de que não precisava ou não queria comprara. Era um anão que veio ali apenas para irritar o vendedor. Era uma verdadeira vingança contra todos os anões vilipendiados, humilhados e discriminados que havia no mundo. Mas a vítima da vingança agora era eu. Logo eu que sempre fiquei ao lado dos fracos e oprimidos. Se soubessem a minha revolta quando soube que na França havia uma competição de arremesso de anões a distância. Não que não fosse engraçado imaginar o pequenino sendo pego pela perna por um fortão que ia girando, girando e girando loucamente em torno de sua cabeça, enquanto isso o anãozinho urrando, até soltar e ir correndo ver a que distância que ele havia caído. A vontade que dá da gente rir, vem certamente de um espírito cruel que habita nosso subconsciente. Mas, pensando bem, não havia nada de revoltante imagina AQUELE anãozinho chato sendo arremessado.
Aí imaginei o Samurai Gourmet. Seu samurai entrando feroz na farmácia e dizendo tudo que eu desejaria ter a coragem de dizer. E arremessando o danado do anão, é claro, lá no meio da rua e uma caminhão passando sobre o anão, engatando uma ré e passando de novo, até que o pequeno e chato anãozinho tivesse virando uma simples pasta confundindo-se com a tinta do asfalto.
Ei, que legal! Meus pensamentos malvados me fizeram distrair e, quando dei por mim, a dor de cabeça havia definitivamente passado. Agora podia ir pegar meu passaporte. A imaginação é um santo remédio.
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