Não sei o que dizer
Mas sei o que fazer
Não me ouça
apenas me veja
E o que digo
não siga
pois não há mais
que eu consiga
falar de mim
Meu exemplo
é meu templo
e o dia a dia
meu dever
de ficar em
nada a dever
pois saiba meu amigo
que a minha história
é a minha oratória
Benno
Lembranças de mim
Mas sei o que fazer
Não me ouça
apenas me veja
E o que digo
não siga
pois não há mais
que eu consiga
falar de mim
Meu exemplo
é meu templo
e o dia a dia
meu dever
de ficar em
nada a dever
pois saiba meu amigo
que a minha história
é a minha oratória
Benno
Lembranças de mim
As nuvens mergulhavam no horizonte como gaivotas neuróticas e ensandecidas. Se seguiam o Sol ou perseguiam a Lua nem sei dizer ao certo, mas sei que formavam um espetáculo estarrecedor, num bailado sem propósitos.
Como todos os dias, eu fazia minha eterna caminhada ao longo da praia, contanto caramujos e chutando conchas. Os tórridos grãos de areia, ainda lembrados do calor do desfalescente Sol, acariciavam-me e ao mesmo tempo queimavam-me as solas dos cansados pés.
Eis que mais um dia findava e eu nem sabia qual a razão de tê-lo vivido. Os dias são assim, mesmo os inesquecíveis como o bailado anoitecescente das gaivotas. Toda vez que eu via o céu assim, desabando na noite, eu lembrava de um dia quase noite igual a tantos outros, igual a este mesmo dia de agora, em que eu me perguntava - será que daqui há muitos anos eu ainda lembrarei deste momento? E foi assim que ele se gravou indelével em minha memória. Aquele momento, que nada tinha de especial, ficou ali gravado como uma fotografia para sempre e talvez perdure mesmo além da minha morte.
Dali, daquele momento lembrado, vem minha mania de colecionar momentos aleatórios. Numa hora qualquer do dia, eu resolvo me lembrar daquele momento para jamais me perder de mim. Então, eu procuro uma coisa qualquer, um graveto, um seixo, uma tampinha de garrafa, qualquer coisa que esteja por ali, uma referência menmônica daquela lembrança, que depois guardo num cofre. Este é meu cofre onde guardo as lembranças que tenho de mim. Não das lembranças dos meus grandes momentos, mas daqueles momentos comuns, pequenas fotos do meu dia a dia, que, num dia desses comuns caminhando pela praia eu tive medo de perder na noite do esquecimento.
Benno
Ps: Meu conto "O Oitavo Casamento" foi publicado na excelente revista on-line Germina. Agradeço às editoras da revista, em especial à Mariza Lourenço, a honra que me foi concedida.