terça-feira, 21 de novembro de 2017

O Dente da Girafa


Chegou o grande dia. Teresa finalmente vai casar com um lindo mancebo. Pedro. Bem situado na vida e elegante, lá vem o noivo, com seu fraque eum lenço no bolso. Dentro daquele bonito lenço porém, há um segredo escondido. Todo mundo traz um segredo, nem sempre no bolso, muitas vezes no coração. Este segredo estava apenas no bolso e no passado de Pedro. Qual seria? Deixemos o casamento rolar, que isto vai por si só se esclarecer.
Agora, vai entrando a noiva com seu pai e, logo a seguir as damas de honra. Quando o noivo vê uma das damas de honra, ele fica gelado de pálido, tudo porque a dama de honra que estava prevista foi substituída por outra, e ele não fazia ideia que a melhor amiga de infância e que ela tinha perdido contato, era justamente a Maria Helena, que tem tudo a ver com o segredo que ele esconde dentro do lenço.A mesma Maria Helena que ele havia conhecido quando adolescente num lugar bem distante dali alguns anos atrás.
Tudo começou quando Pedro foi participar de um safári na África. Ele queria ver finalmente uma girafa em seu habitat natural, como tantas vezes ele já havia visto nos episódios que ele assistia no mundo animal. Foi lá que ele aprendeu que as girafas são seres muito diferentes. São os animais mais altos do mundo. Nisto, tanto ele como Maria Helena se pareciam, pois eram muito altos. Já Teresa, a noiva, era baixinha.
Por outro lado, as girafas dormem em pequenos cochilos e ficam em pé quase o tempo todo.
Nisto também são parecidos Maria Helena e Pedro quase nunca dorme, ao contrário de Teresa  que dorme muito.
As girafas, apesar de serem muito altas correm muito rápido podendo atingir quase 70 quilõmetros por hora, no que se parecem muito com Teresa que, apesar de ser baixinha, foi campeã de 100 metros rasos nos jogos universitários.
Reza uma lenda africana que a troca de dentes girafa, quando acompanham uma jura de amor no dia em que a mulher perde a virgindade, possui grandes poderes. Tem o poder de realizar qualquer desejo.
Pois não é que Maria Helena era guia no safári? Durante o safári, eles se envolveram e acabaram fazendo juras de  amor, tiveram sua primeira relação sexual em que Maria Helena perdeu sua virgindade, e se ´prometeram  casar um dia e serem felizes. Tudo isso acompanhado de troca de destes de  girafa, como havia sugerido um feiticeiro dias atrás.
Quando acabou o safári, os dois de separaram e Pedro esqueceu Maria Helena, mas não do dente. E Maria Helena esqueceu do dente de girafa mas não de Pedro,
Passados os anos, Maria Helena nunca tivera notícias de Pedro, Tinha o dente guardado no fundo do baú e não se lembrava deste pequeno detalhe. Não acreditava na lenda. Mas lembrava de todo o resto, do seu romance com Pedro, das juras de amor, de prometerem se reencontrar já com as vidas feitas e se casarem, terem filhos e serem felizes.
Pedro, por outro lado, rapidamente esqueceu Maria Helena. Mas trazia sempre guardado em um lenço o dente de girafa e, sempre que tinha uma dificuldade, o dente de girafa o assistia.. Foi assim que cresceu na vida, se tornou bem sucedido, hoje estava rico. Era hora de casar e constituir familia, Nem pensou em suas promessas ou em Maria Helena. Ela fora apenas uma aventura de férias, nunca levou isso a sério. Não sabia que não se podia prometer e descumprir para uma moça apaixonada. Não sabia também, e esta era uma parte da lenda que ele havia esquecido ou não prestara atenção quando o feiticeiro o alertou, que o demônio ou entidade que era invocada pelas juras de amor quando da cerimônia da troca de dentes de girafa, não perdoava o descumprimento das promessas e, caso isso acontecesse, ela viria depois cobrar.
Dias atrás, qual não foi a surpresa para Maria Helena, quando sua antiga amiga de infância, disse que ia casar e a convidou para ser dama de honra em lugar de uma outra amiga que tivera que viajar repentinamente. Ainda maior foi sua surpresa quando viu estampado no convite o nome de Pedro. Na carta, Teresa havia incluido uma foto de seu noivo. Não havia dúvida, era o mesmo Pedro por quem continuava apaixonada.
Agora era chegado o dia do casamento e lá estava Pedro, com seu fraque e com seu talismã secreto o dente de Girafa. Teresa sorrindo, Maria Helena escondendo o choro, Pedro apertando o seu dente de girafa. Antes de vir para a igreja, Maria Helena finalmente lembrara do dente de girafa, procurou e achou no fundo do baú onde o havia deixado. De uma hora para outra, lembrou-se da lenda e de que a voto descumprida conferia poder a talismã de propiciar a vingança do amor traído.
Como soube que Pedro melhorara muita de vida depois de sua aventura na África, ela supôs que o talismã fora responsável pelo sucesso, mas o outro dente de girafa que nunca fora usado ainda esta novo, com sua fonte de poder ainda intacta.
Esclarecidas as coisas, voltemos ao momento do casa que ensejou esta retrospectiva. Na hora do casamento ante o espanto de Pedro, Maria Helena invocou o dente e pediu que acontecesse alguma coisa com o vestido de noiva, que ele levantasse. Um vento forte soprou um vento muito forte mesmo, soprou e levantou o vestido de noiva, A noiva, desesperada, tentava controlar o vestido, mas o vento era mais forte. O vestido subiu e subiu e subiu muito alto, Agora todos já podiam ver, em todo esplendor, a calcinha, o sutiã e o rosto vermelhos de Teresa. Maria Helena, muito feliz, pediu que o vestido queimasse. No mesmo instante, o vento fez uma vela cair sobre o vestido de Teresa, e o vestido ardeu rapidamente. Pedro, desesperado,  correu para acudir e tirar o vestido, ao mesmo tempo que tentava apagar o fogo. Teresa urrava de dor pelas muitas queimaduras que havia sofrido. Maria Helena pediu ao dente que Pedro perdesse o seu dente de girafa para sempre. Em meio ao combate as chamas, o lenço de Pedro caiu de seu bolso. Outra pessoa que tentava também ajudar, pisou em cima do lenço e na mesma hora, o dente se partiu em mil pedaços, virando poeira.
Maria Helena, satisfeita, saiu e fez ainda um último pedido. - Que o teto desabe e o dois noivos morram... Sentenciou.




quarta-feira, 15 de novembro de 2017

O Giz e as Borboletas Azuis

O novo professor de matemática era sério, mas bonitão. As moças ficaram logo encantadas, especialmente Regina. Ela era uma aluna mediana que não gostava muito de matemática, mas, com aquele professor, ela começou a se interessar. Nunca antes quisera saber de logaritmos, trigonometria ou álgebra, apenas de batom, maquiagem e roupas sexys. Aquilo tudo de matemática parecia uma grande embrulhada. Mas a voz do professor, profunda e máscula, lhe mexia as entranhas, provocava sua libido, atiçava até quem diria, a sua curiosidade.
Começou a se interessar pelas coisas da matemática que de uma embrulhada passou a ser o código que regia o mundo. A música, aprendeu a partir de então, que tanto lhe embalava o espírito, era uma tradução daquele código antigo, como uma simbologia druídica que animava os seres vivos e não vivos.
O que Regina não sabia é que tinha um grande admirador secreto logo ao seu lado. O estranho Paulo, que não desgrudava os olhos da menina. Ele achava nela tudo de atraente e encantador, mas nunca revelara nada a ninguém. Não se achava merecedor, mas mesmo assim sonhava e todo mundo pode sonhar sem interferência se mantiver seu sonho só para si. 
Mas, coitado, não havia nascido com atrativos e as moças não davam bola para ele. Os outros meninos também não gostavam dele. Ele sabia disso e por isso não se atrevia a se declarar para Regina. 
Todo dia ele acordava cedo e se aprontava antes dos outros para ir observar a menina indo para a escola.
Ficou com um verdadeiro ódio quando percebeu que todas as atenções dela se concentravam no professor. Lhe causava mais ódio ainda o fato de ele adorar matemática e ela odiar e, também, a mania que ela tinha de pegar o giz que o professor usava durante a aula e guardar na bolsa. Todo dia ela pegava um giz e colocava na bolsa. Para que ele não podia adivinhar e justamente por isso ele detestava aquele hábito.
Um dia, cismado com a mania de colecionar giz usado pelo professor, pensando que, talvez, o giz fosse para ela um elemento erótico, percebeu que uma borboleta azul o seguia. Ele sentou num banco de praça e percebeu que a borboleta pousou em seu ombro. Ficou observando a borboleta, mas não a conseguia ver pois só conseguia ver Regina. Ali estava, a sua disposição, em todas as suas cores o esplendor natural de uma borboleta, que por qualquer motivo desconhecido o confundira com uma flor. O mundo todo rejeitara Paulo, mas Paulo rejeitara a borboleta porque não conseguia ver nada além de Regina e o professor de matemática, as fontes de todo o seu amor e ódio. Talvez a borboleta azul fosse atraída exatamente o que rejeitavam os humanos.
A borboleta o seguiu o dia todo, mas ao final da tarde encontrou uma flor onde pousou e desistiu de Paulo. A partir desse dia, sempre havia uma ou mais borboletas por perto de Paulo, mas ele deixou de repara nisso.
Regina, por sua vez, chegava em casa, olhava para o seu giz e imaginava ele todo cheio do cheiro do professor. E imaginava-se perdendo em seus braços, misturando seu corpo ao dele.
Ela começou a segui-lo. Não percebeu que por sua vez era seguida. Um dia, o viu entrar em um café. Ela se decidiu e entrou em seu caminho, dando uma trombada e caindo em seus braços. Seus olhos, fingindo surpresa e esbanjando sedução, pousaram nos olhos  do professor e este se sentiu fortemente atraído. Não era para menos, Regina nascera com aquele encanto que deixa os homens desarmados. Ele pediu desculpas e a convidou para tomar uma café. Em pouco tempo estavam conversando como velhos conhecidos. Ela e o professor esbanjavam tudo que tanto faltava a Paulo. Não demorou e ele a convidou para sua casa. O que lá aconteceu não foi conhecido mas adivinhado por Paulo, que não parava de os seguir. Ele fotografou tudo. Eles se encontrando no café, conversando, entrando na casa do professor, saindo horas depois com um sorriso de felicidade no rosto. Sim, Tinha sido a primeira vez de Regina, Enfim, seu primeiro homem. E ela ficou completamente apaixonada. Ele, nem tanto, Era só mais uma. Era casado e aproveitara o fato da esposa estar viajando para dar uma fugida e, apesar de Regina ser linda, ele não queria comprometer sua vidinha arranjada e pacata.
Paulo, morrendo de ódio, levou as fotos para a diretoria. A diretoria, ao saber do acontecido, convocou o professor e o demitiu, 

Regina, ao saber que o professor sido demitido e havia mudado de cidade, entrou em desespero. Dois dias depois, foi encontrada morta, abraçada a  um saco cheio de pedaços de giz molhados por uma substância que depois constataram provir de lágrimas. 

Nunca mais ouviram falar de Paulo. 
Um ano depois, quando ninguém mais lembrava da tragédia, uma garota desapareceu da escola. Encontram-na dias depois na mata, seu corpo nu e sem vida na floresta. A arma do crime, sua calcinha e sua bolsa foram mais do que suficientes para incriminar o zelador da escola, apesar deste alegar não saber como aquelas coisas foram para ali. Ninguém reparou que a vítima era muito parecida com Regina e seu corpo fora encontrado coberto de borboletas azuis.

segunda-feira, 13 de novembro de 2017


Sergisvaldo era assim desde menino. Com seu olhar, dominava a todos. Os pais, os amigos, os professores, adultos, velhos e crianças morriam de medo daquele olhar. Ele se acostumou com aquilo e obtinha tudo que queria com um simples olhar. Seu olhar era uma ordem e pronto. Nunca ninguém havia tentado descobrir o que aconteceria em caso contrário.
Sempre foi assim, até conhecer Marisnalva. Ela tinha o olhar ainda mais poderoso, pelo menos para ele. Ela também foi a primeira a contestar seu olhar e a sua primeira mulher de verdade também. Foi amor a primeira vista e foi a primeira vista que ele se entregou  aos seus comandos. Se casaram em pouco tempo.
Ele obedecia e tinha medo. Ela o surrava vez por outra com um terrível chicote e ele simplesmente não conseguia reagir àquele olhar. El,e que de mandão virou submisso, de lobo se viu transformado em cordeiro,  aguentou aquela situação apenas por algum tempo. Um ano e meio, para ser mais exato.
Um dia, quando ele quis de verdade realizar uma fantasia sexual e Marisnalva não o permitiu, apesar de suas insistência e apesar de ele nunca ter se recusado nada a ela, por mais estranho e humilhante que fosse. Não só recusou como acabou o surrando com o chicote e enchendo suas costas de lanhos sangrentos, e o amor se transformou em ódio, na mesma intensidade só que ao contrário.
Ele decidiu que só tinha um jeito. Era matar Marisnalva ou se condenar a submissão por todo o sempre. Ficou com a segunda opção, é claro.
Ele deixou um facão sob a almofada do sofá. Não havia perigo dela descobrir pois ele é quem arrumava a casa. Isto ela deixou claro desde o princípio. Mas, chegado o momento dele executar seu plano, aproveitar que ela estava distraída e golpeá-la pelas costas, ela se virou e o fuzilou com seu olhar mais indiscutível e ele recuou e desistiu como sempre.
Num primeiro momento, ele desistiu da ideia, mas depois descobriu por acaso que ela o estava traindo com outro homem e resolveu-se novamente a enfrentá-la. Mas, para isso, primeiro precisava treinar. Talvez, se se acostumasse a matar, enfrentasse a situação e se acostuma-se a ela, talvez não recuasse numa outra tentativa. Resolveu começar com alguma vítima ao mesmo tempo aleatória e indefesa.
Uma criança. Porém as crianças tem pais. Mesmo assim, é um bom começo, não tem força nem experiência para se defender.
Foi ao parque. Os brinquedos ficam ao lado de uma floresta. Um lugar muito estratégico. Observou o parque a procura de uma mãe distraída. Havia uma que deixava sua filha a vontade, enquanto lia. Durante uma hora, apenas uma vez foi verificar como estava a filha. Depois, continuou lendo. Ele atraiu a menina oferecendo um pirulito. Foi a chamando em direção a floresta. Lá chegando, viu a criança a sua disposição. O seu lindo pescocinho a disposição para ser esganado. Mas, que nada. Sergisvaldo ficou com pena. Pensou consigo - O que é que estou fazendo? Matar uma criança ? Que covardia. Deixou a criança ir.Foi seu primeiro fracasso.
Da segunda vez, resolveu atacar uma velhinha. Sim, uma velhinha seria uma boa. Indefesa, já viveu bastante e tem pouco por viver. Como treino seria legal.
Soraia, tinha oitenta e dois anos. Foi sua primeira vítima. A coitadinha mancava e não enxergava bem e, por isso, não pode oferecer muita resistência. Para começar foi bom. A velhinha gostava de passear com seus gatos à noite e fio fácil surpreendê-la numa viela escura e solitária, dessas que existem em quase todos arrabaldes pobres das cidades.
Da terceira vez foi mais ousado. Acompanhou um rapazinho por dias, estudou seus movimentos. Viu que ele era calado e solitário e, por isso, sofria bulying dos colegas. Não tinha amigos e gostava de buscar os caminhos mais longos e solitários tanto para ir para a escola como para voltar para casas. Era claro que o menino não se sentia feliz nem em casa nem na escola, ou seja, não era feliz em lugar algum. Começou a encontrar um sentido nas coisas que estava fazendo. Matar aquele rapaz seria livrá-lo de um peso. Sentiu orgulho e percebeu que começara a gostar do que estava fazendo, esquecendo por completo das muitas vezes que humilhara seus colegas na escola quando ainda era um menino. Desta vez, ao praticar seu ato atroz, não sentiu nojo. Teve até prazer no que fez. Em seu delírio chegou a ver gratidão nos olhos que na verdade expressavam pavor na hora da morte.
E aí foram muitas vezes, muitos assassinatos. Ele foi para as manchetes dos jornais - Assassino em série atava de novo. E foi ficando viciado em matar. E foi adiando seguidas vezes o assassinato que no inicio serviu de pretexto para ele se tornar o que era. Um psicopata cruel que sente prazer no sofrimento dos outros.
Porém não praticara todos aqueles assassinatos. Pois não é que um outro assassino lhe seguia os passos e imitava seus métodos. Boa parte dos assassinatos não fora ele que cometera, mas outro ou, quem sabe, outros assassinos que atuavam na região. Este outro era até mais cruel, pois sempre deixava sinais de ter torturado a vítima o que causava mais horror. 
Finalmente, já se sentia seguro para concluir seu plano, ou seja, assassinar a mulher. Ele já se sentia forte o suficiente para enfrentar aqueles olhos dominadores.
Entrou decidido foi procurar debaixo da almofada do sofá onde havia  escondido o facão com que pretendia golpear a sua última vítima. Sim, última. Decidira abandonar aquela vida de crimes após atingir sua meta final. Sabia que era errado continuar aquilo. O outro assassino acabaria recebendo a fama pelos seus crimes, mas ele não se importava com a repercussão. 
Mas, surpresa! O facão não estava lá. Alguém o tinha retirado, tinha certeza. Quando começou a se ligar de quem poderia ter sido, já foi tarde demais. Recebeu o primeiro golpe pelas costas e caiu no chão, prostrado e inerme. Logo em seguida, escutou a voz de sua esposa. 
- Você achou mesmo que poderia ter feito tudo isso sem que eu descobrisse? Não só descobri como fiz o mesmo. Eu sabia que você ia querer me matar, que era para isso que você estava treinando para pegar coragem. HAHAHAHA. Que ridículo que você é. Quando você vai, eu já estou voltando, será que ainda não entendeu isso?
Golpeou várias vezes até vê-lo bem morto, afogado em uma poça de sangue. 
Ao terminar, ouviu as sirenes dos carros de polícia ao redor da casa. Saiu de braços levantados e gritou. 
- O assassino era o meu marido, descobri ontem e tenho provas disto. Ele ia me matar. Deixou isto escrito em seu diário. Eu o matei em legítima defesa. Ele está aqui no chão da cozinha mortinho da Silva. 
Será que Marisnalva ia conseguir explicar a razão de tantas facadas. Só o ódio as poderiam explicar.