quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Em uma caverna, em plena idade média, três bruxas discutiam suas mais novas poções. Elas evocaram as forças sobrenaturais para que agissem conforme suas vontades e começaram a disputa.
Elinora foi a primeira: 
- Minha poção é feita com escamas de couro de crocodilo, uma pitada de teria de aranha, três pedacinhos de unha de cavalo, uma mecha de cabelo de bebê e dois olhos azuis femininos, mistura tudo e deixa ferver no caldeirão. Serve para picada de mosquito, coceira no dedão e pulga.
- hahahahaha! foi sua terrível e sinistra gargalhada, E a sua poção, como é.
Agora, era a vez de Narda: 
- A minha é bem simples. Ferve leite de magnésia e derrete, aos poucos, cubos gelados de sangue de canário. Depois, basta um pitadinha de de gelatina de ovo de serpente e a mistura explode, espalhando uma fumaça verde e fagulhas cor de rosa. É lindo demais. Mas não serve para nada, só para assustar -hihihihihihihi, Riu-se a beça. - E você, Dindalina? O que tem para mostrar desta vez?
- Puxa. Estou sem graça (Dindalina era uma bruxinha nova, inexperiente, tinha lindos olhos e mechas douradas lhe caiam sobre as bochechas). Minhas poções são tão sem graça perto das suas... Sou tão inexperiente.
Mas mesmo assim, tenho este creme que fiz para manter minha cutis macia e delicada. Querem provar.
Elinora e Narda, que eram horrorosas, feias enrugadas e tinham o rosto cheio de verrugas cabeludas, correram apressadas e espalharam o creme no rosto.
Subiu uma fumaça e elas se transformaram em poeira que um vento leve soprou pela janela.
Dindalina, saiu cantando, saltitante e feliz e se embrenhou no ventre negro da floresta.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017


A caverna

A espeleologia é uma ciência que estuda as cavernas e foi fundada por Martel. Edourd Martel era advogado, mas amante da natureza, foi o primeiro a explorar uma caverna sob uma perspectiva espeleológica, tendo explorado pela primeira vez com sucesso as cavernas de Abime Bramabiau e Grotte de Dargilan na França. O termo, entretanto, foi criado depois por Emile Rivière a partir dos termos gregos spelaion (caverna) e logos (palavra) no sentido de descrição das cavernas.

Eu sou estudante na universidade e estou fazendo um curso de espeleologia. O assunto é realmente fascinante, pois as cavernas foram guardam diversos segredos da Terra. Podem conservar formações antigas, vestígios de animais e plantas fossilizadas e também foram habitação dos seres humanos em sua pré-história. É como se fossem verdadeiros baús repletos dos mais reluzentes e variados tesouros.
A atividade biológica forma, ao longo do tempo,  depósitos calcários e estes são soterrados pelos aluviões dos rios, da atividade lacustre e da erosão. Estes depósitos, quando são per-colados por substância ácidas, são dissolvidos e criados espaços vazios no seio da terra. Esta a é origem das cavernas.
Meu professor de espeleologia é muito divertido. Ele fala das cavernas como se elas fossem seres vivos e seu amor pelas cavernas é tão grande que ele as trata como se fossem suas namoradas ou companheiras. Seu nome é Tirso e ele é muito popular entre os alunos, apesar de ser tão estranho. Suas aulas despertam grande interesse entre os alunos e desfruta de certo renome na comunidade acadêmica também, por algumas relevantes e consistentes contribuições à ciência.
Tenho uma amiga chamada Daisy que conheço desde o primeiro grau e que já foi minha vizinha. Ela está matriculada no curso de espeleologia também e gosta das cavernas tanto ou mais do que eu.  Eu sempre fui apaixonado por ela, mas nunca me declarei, pois sempre fui muito tímido. Seus olhos além de inteligentes são de um azul que não se encontra nem nos lagos que dormem esquecidos nos fundos das cavernas.
A pergunta mais frequente que nós, amantes das cavernas, fazemos, é que mistérios as cavernas podem esconder. São mapeadas mais de quatro mil cavernas só aqui no Brasil, mas calcula-se que devam existir oitenta mil, Isto dá uma dimensão do quanto se desconhece ainda sobre as cavernas, apesar de tanto que se tem estudado. A caverna de Mamooth, no estado de Kentucky nos Estados Unidos, é a mais extensa do mundo com seus 640 quilômetros de túneis explorados.
O nosso professor marcou uma excursão para explorar uma caverna próxima. Eu sonho há tempos com isso. As cavernas alimentaram meus sonhos de criança desde o tempo em que li uma adpatação do romance de aventuras Viagem ao Centro da Terra de Julio Verne, em que o famosos geólogo Oto Lidenbrock, junto com seu sobrinho Axel e sua afilhada Grauben, procura repetir os passos do alquimista medieval Arne Saknussem, que deixara um manuscrito encontrado dentro de um livro antigo, descendo ao centro da terra a partir da garganta do vulcão adormecido Sneffels na Islândia e expelido, tempos depois, em uma erupção do vulcão Stromboli na Sicilia.
Porém, apesar dos atrativos e charme, uma excursão para uma caverna pode ser algo bastante perigoso. As cavernas escondem perigos tais como as paredes instáveis e risco de desabamento, animais assustadores, perigosos ou desconhecidos, tais como morcegos, aranhas, escorpiões e  serpentes, e, ainda, pode ser esconderijo de pessoas excluídas da sociedade, tais como assassinos, foragidos da justiça, bandoleiros e outras figuras perniciosas. A gruta dos quarenta ladrões que Aladim, nas Mil e Uma Noites, desafiou violar, é coisa sempre presente no imaginário popular.
O professor nos alertou desses riscos que ele diz serem administráveis até certo ponto, mas as cavernas nunca podem ser totalmente administráveis, pois quase como seres vivos independentes e imprevisíveis. E, lembrava ele, a incerteza, a beleza e o mistério andam sempre de mãos dadas. Assumir o risco é, de certa forma, viver, estar seguro é sempre se internar num túmulo antes da hora.
Começamos os preparativos para explorar a caverna do Diabo, umas das maiores existentes nos arredores.
Muitas lendas se contavam sobre a caverna, que era habitada, que era antiga, que nela existiam animais desconhecidos e ainda contavam histórias de vampiros, de lobisomens, de seres abissais, mortos vivos, gases venenosos e alucinógenos, vestígios de civilizações desaparecidas, túmulos de antigos reis e ancestrais de tribos extintas, cidades enterradas sob toneladas de depósitos piroclásticos e coisas assim, mas um bom cientista não acredita nessas coisas sobre naturais.
Uma das partes mais importantes da exploração de cavernas é o seu planejamento. Isso parece chato e aborrecido, mas é a parte mais importante e que exige conhecimento e técnica. É preciso se cercar de cuidados, tais como providenciar capacetes com lanterna, além de lanternas adicionais e bateria para muitas horas. A caverna é o império da escuridão e não se pode deixar a iluminação de lado. Além disso, por ser um lugar bastante inóspito, é preciso levar água e alimentos abundantes.Um mapa da caverna é extremamente importante para visitar lugares já conhecidos, mas na exploração de uma área desconhecida de uma caverna caverna convém usar uma bússola e levar material para ir construindo um mapa durante a explora. Ressalte-se que o GPS não funciona dentro de uma caverna, pois lá dentro ele não consegue enxergar os satélites que servem de referência. Como também não se enxerga as estrelas, nem o Sol, resta apenas os mapas e a bússola para servir de orientação.
Tudo pronto partimos. Com Tisso sempre à frente e seguido de perto por mim e por Daisy, atravessamos tortuosos caminhos, alguns até bem até bem íngremes, mas todos bem conhecidos e mapeados. Entramos por uma passagem extremamente estreita e entramos num salão extremamente grande com um lago no centro. Contornamos o lago e entramos em outra passagem estreita. Por uma estranha distração, acabamos entrando em passagem que não estava mapeada e, sem querer, começamos a invadir o desconhecido. Já andávamos por esta passagem estreita quando percebemos que esta não era a passagem que pensávamos ser, muito mais curta e que deveria desembocar em um novo salão famoso por suas estalagmites e estalactites douradas e por cascatas de águas esverdeadas que se derramam sobre rochas de cores sanguineas com incrutações violáceas, resultados de antigos depósitos vulcânicos superpostos.
Ao nos darmos conta do equívoco, o professor Tisso juntou a turma e avisou:
- Erramos o caminho e entramos por um túnel não mapeado e isso pode ser muito perigoso, pois não sabemos o que pode haver pela frente; vamos voltar.
Assim que começamos a retroceder, sentimos um tremor seguido por um grande barulho, assemelhado ao de um trovão, vindo do caminho que havíamos passado. Pouco tempo depois, vimos que um abalo sísmico havia fechado nosso caminho. O teto cedera e toneladas de pedra tornavam impossível a nossa volta. Como não tínhamos trazido picaretas e pás, por serem muito pesadas, não tínhamos como desobstruir a passagem.

A única alternativa seria seguir pelo túnel desconhecido, pois havia grande chance de existir interligação com passagens e salões mapeados.
- Vamos pessoal, agora não vai ter jeito, temos que seguir em frente - falou o professor.
 Eu já estava bastante assustado. Por outro lado, a aventura era tanta, que seria uma oportunidade inigualável de explorar o desconhecido, uma aventura emocionante como nunca tivéramos a chance de viver. Por isso, apoiei o professor dizendo:
- Coragem! Vamos seguir em frente, pode ser uma oportunidade de realizarmos uma grande descoberta.
Poderíamos mesmo, pensei cá comigo, dar nomes ao locais futuramente, por termos sido os primeiros exploradores dessas passagens e inscrevermos nossos nomes na eternidade. Andamos muito tempo e, enquanto isso, a passagem ia ficando cada vez mais estreita. A partir de um certo ponto, um ruído de correnteza se ouvia em alguma câmara paralela. Era provavelmente algum rio subterrâneo.
Finalmente tivemos que passar por um túnel tão estreito que só podia passar um por vez agachado, rastejando, pois era muito baixo. Ainda bem que todos estavam em forma.
- Quem se arriscaria a ir primeiro? - perguntou o professor.
Eu, mas do que depressa, me ofereci.
- Eu, professor, pode deixar comigo - falei com a voz altissonante e segura.
Era essa uma oportunidade de mostra minha coragem para Daisy. Corri o olhar pelos seu olhos azuis que brilhavam num misto de medo a admiração. 
Me enchi de coragem, estufei o peito e segui adiante, rastejando em meio às rochas escarpadas e, como merecida recompensa, tive o privilégio de ser o primeiro a admirar uma maravilha totalmente inesperada. Pois ao final desta passagem havia um grande salão que não estava no mapa e tinha uma construção de porte em seu meio. Olhei admirado sem saber se aquilo era um túmulo, uma habitação ou vestígio de uma antiga civilização. Ajudei os outros a atravessarem o túnel estreito e ao vislumbrarem a construção ficaram todos admirados por tão notável descoberta. Investigando melhor a construção, diversos aspectos curiosos e mesmo mórbidos, tais como a inscrições feitas em uma linguagem desconhecida que não era formada nem por ideogramas, nem por hieroglifos, nem por caracteres cuneiformes, acho que nem mesmo Champlion os poderia decifrar, além de diversos desenhos de seres estranhos, muito deles alados e parecendo zumbis, de ossos e de caveiras em profusão decorando as inscrições em extensas molduras filigranadas e  esculpidas nos muros externos e internos do estranho edifício. Bem no cetro da construção, uma colossal tampa cobria um buraco, tudo nos levando a crer que se tratasse de uma tumba antiga. Esta pedra era ornada com figuras estranhas pois de suas cabeças despontavam pontudos chifres. A primeira impressão que tive é de que a tampa cobria o buraco do diabo ou então alguma passagem direta ao inferno de Dante. Parecia ser a tumba do próprio demônio, uma tumba erigida para servir de templo de cultos sinistro de antigas civilizações bárbaras na qual se evocavam as forças malignas a agirem contra os inimigos.
O mais impressionante aconteceu quando o professor esbarrou em uma alavanca sem querer, tendo acionado algum mecanismo automático. Um terrível rangido de engrenagens enferrujadas e sem lubrificação, foi acompanhado pelo movimento lateral da tampa e uma buraco sem fundo começou a
se mover e um gás esverdeado começou a evolar de dentro do abismo negro e este gás
invadiu nossas narinas. O que senti de imediato foi uma espécie de tontura, seguida de um incontrolável medo. Vozes começaram a sussurrar nos meus ouvidos, falando palavras de ódio, ameaças mortais, vozes que, sabíamos mesmo sem entender uma palavra, nos amaldiçoavam. A única coisa que consegui pensar foi em correr dali, indo para o lado oposto de onde tínhamos vindo, os outros, não soube na hora  o porque. Ali, na outra extremidade, um novo túnel, este bem maior nos levou para outra câmara bem menor.
- Salve-se quem puder - gritou o professor, e seguiram todos correndo para a mesma direção.
Enquanto corríamos, as vozes nos seguiam, assim como passos tenebrosos que emitiam rugidos tais que se pareciam trovões. Nesta câmara havia um lago , no qual mergulhei, pois alguma coisa me dizia que era a única forma de escapar e na lateral desde lago avistamos uma luminosidade dentro a água. Era uma passagem que, possivelmente, nos levaria para fora da caverna. Mergulhei e nadei desesperadamente até sair em outro lago de águas iluminadas. Só pensei em subir, pois o ar estava no fim. Saímos em um lago fora da caverna e a céu aberto e nos salvamos todos, já que os outros me seguiam.
- Quando cheguei a margem do lago, só pensei em Daisy, pois me preocupava com sua segurança. Mas ela sabia se virar sozinha e a avistei em segurança. Corri em sua direção e perguntei como estava.
- Estou bem, assustada, é bem verdade, mas  estou bem.
Eu a abracei apertado e senti sua respiração contra meu peito.
Depois disso, acabamos encontrando o caminho de volta para casa, mas nunca mais conseguimos identificar a passagem pela qual entramos na caverna do túmulo, como a batizamos, por mais que tentássemos. Muita gente não acreditou na história, mas não havia razão para termos mentido. Alguns diziam que tínhamos aspirado o gás estupefaciente evolado da rocha que isso havia nos levado a uma alucinação coletiva, mas ainda está bem presente em minhas memórias tudo que vi na escuridão da caverna. Por outro lado, a aventura me ajudou a me aproximar de Daisy, e hoje somos lados da mesma moeda. O professor foi nosso padrinho de casamento.
Parecia que ia tudo bem para todos nós;
Porém, um noite, senti um tremor estranho. E começou a dar tudo errado. No fundo, desde de o inicio eu sabia : Estávamos amaldiçoados.

-FIM -